A Igreja Católica confirmou pela primeira vez perante a Justiça que, pelo menos desde 1978, sabia que a ditadura militar assassinava as pessoas detidas-desaparecidas, coisa que jamais tinha tornado pública, e que as suas máximas autoridades discutiram com o chefe supremo da ditadura a respeito de como administrar a informação sobre esses crimes. A admissão tardia produziu-se com o reconhecimento da autenticidade do documento publicado pelo Página/12 no dia 6 de maio último, sobre o diálogo secreto com o ditador Jorge Videla, de 10 de maio de 1978, depois de um almoço do qual participaram os três membros da Comissão Executiva que conduzia a instituição. Em que pese a gravidade das revelações, tanto o Episcopado como o Vaticano e a grande imprensa guardam um escandaloso silêncio a respeito.
A questão das listas
A judicialização do documento eclesiástico produziu-se no processo aberto para determinar o que aconteceu com os restos mortais de Roberto Santucho, a pedido de sua família, representada pelo advogado Pablo Llonto. Santucho foi abatido por um grupo do Exército em 19 de julho de 1976, e seu corpo exibido à imprensa no Campo de Maio, mas logo desapareceu sem explicações. Após a confissão de Videla a um jornalista espanhol e a outro argentino sobre os assassinatos dos detidos-desaparecidos, a juíza federal de San Martín, Martina Forns, responsável pela causa, citou o ex-ditador. Videla disse que ele tinha decidido ocultar o destino dos restos mortais de Santucho para evitar homenagens, mas que quem sabia o que se tinha feito com eles era o então chefe do Campo de Maio, general Santiago Riveros.
Trinta e cinco anos depois, o encobrimento continua. Quando o jornalista espanhol Ricardo Angoso o entrevistou na prisão que o Serviço Penitenciário Federal mantém no Campo de Maio, Videla disse que “minha relação com a Igreja Católica foi excelente, muito cordial, sincera e aberta”, porque “foi prudente”, não criou problemas nem seguiu “a tendência esquerdista e terceiro-mundista” de outros Episcopados. Condenava “alguns excessos”, mas “sem romper relações”. Com Primatesta até “chegamos a ser amigos”.
(Horacio Verbitsky - Página/12,Tradução: Katarina Peixoto)
Nenhum comentário:
Postar um comentário